Terceiro ano de faculdade. Seu curso não metia mais
medo, as matérias eram difíceis, mas ele sabia que aguentaria. O cabelo
comprido e a namorada que fazia biologia o encorajavam ainda mais a acabar logo
com o curso. Ainda mais agora que havia comprado um carrinho usado com o
dinheiro das aulas particulares, sabia que precisava seguir logo o caminho do
trabalho.
E o melhor de tudo, havia se livrado de seu
companheiro – sua pedra no sapato, na verdade – Chinelo, aquele cara que achava que pra passar na faculdade era só
dar um jeitinho, fazer qualquer coisa bizarra nas provas e se dar bem no fim do
semestre.
Sua primeira impressão é que aquele ano não seria
difícil, apesar da recomendação e da quantidade de veteranos que faziam as matérias
pela segunda vez. Havia gostado em especial de um professor. Sua filosofia era
interessante:
- O mais importante da minha
matéria é que o aluno saiba se sobressair às dificuldades. É somente isso que
ele precisa para crescer em uma grande empresa.
Assim começou. Ele percebeu que os que faziam o curso
novamente estavam certos. Cálculos, planilhas de custo e receita, impostos etc.
2 semanas e ele estava na mesma situação de sempre. Não sabia nada. 1,5 na
primeira prova:
- Professor, estamos tendo
muitas dificuldades com sua matéria nesse semestre, o senhor poderia nos
ajudar?
- Caro amigo, lembre-se: o
mais importante é que o aluno saiba se sobressair às dificuldades encontradas.
Pense nisso.
Tentou se sobressair, mas não deu. Foi enterrado! 1,5
novamente. E pra piorar encontrou no dia da prova o Chinelo: - Calma, nessa
matéria tudo se resolve, eu mesmo nem me matriculei esse ano porque é tudo
muito tranquilo...
Seu misto de raiva e desespero o acompanharam até a
terceira prova. Naquela manhã desmarcou suas aulas particulares, juntou-se com
os amigos na biblioteca. Ganhou confiança: - Agora vai.
Novamente da série tradicional não se sabe por que acontece: faltando 20 minutos pra prova,
aparece o Chinelo, completamente preocupado:
- Acabei de descobrir que
estou matriculado nessa matéria! Você pode me ensinar, que tal?
Riu. Gargalhou. Como conseguiria em 20 minutos? Porém
sua quase vocação de professor não ia deixar o rapaz da sandália:
- Vamos fazer juntos esse
primeiro exercício. O que você conseguir associar com a prova está ótimo!
- Maravilha, vou decorar
esse exercício na íntegra.
Claro que ele sabia que não ajudaria, mas a cara de
felicidade do descalçado era evidente, nem valeria a pena contrariá-lo.
E chegou a hora. Pelas caras de todos aos 10 minutos
de prova já soube. Era zero na certa. Ao ler a prova, resolveu que era melhor
esperar o tempo mínimo pra sair e entregar em branco, seria menos humilhante.
Estranhamente o Chinelo fazia a prova loucamente. E
escreveu muito, pediu até uma folha adicional. Foi o último a sair. Saiu feliz,
com a cara do empresário que fechou seu maior negócio da vida.
Dia de entrega de notas. Até o gato de estimação da
faculdade estava triste. Sabia que não havia conseguido. Ouviram o sermão:
- Gostaria de dizer que
muitos de vocês não souberam se sobressair às dificuldades, por isso não
conseguiram passar. Porém preciso fazer uma menção honrosa a esse rapaz, que
terá um futuro brilhante em qualquer empresa. E apontou o Chinelo.
- Você, meu filho, será um
dos maiores. Qualquer dificuldade será vencida, gosto muito de seu estilo. Nota
10!
Eis a prova do sem sapato: Professor, esse exercício da prova eu não sei, mas esse aqui eu sei.
Copiou o enunciado e a resolução do problema que havia aprendido 20 minutos
antes. O professor amou, achou que isso sim era a demonstração de força do
futuro empreendedor.
Mais uma matéria perdida. E o valeu pela ajuda, hein! ? Teve certeza que deveria ter virado
hippie...
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